quinta-feira, 29 de outubro de 2009
A música é para todos
Um estranho me chama atenção. Estranhos me chamam atenção, talvez por eu ser um vasculhador de interessâncias novas, ou mais propriamente um carente de contato inédito. O fato é que o porte de maturescência adquirida recentemente sempre me chama atenção: é a concretização de um processo; é a vida ganhando forma semi-definitiva, o início de uma afinação.
Procuro melodias, ritmos, harmonia, música. Procuro vida em um mundo novo e extremamente belo. Vida em semi-breves – chega de semi-fusas! E por isso ser chamado (atenção) à tensão não é o que realmente procuro, é algo que se acha pelo caminho. É só isso.
domingo, 18 de outubro de 2009
Because we are your friends, you never be alone again
Ele não sabia se dormira, pois a ansiedade palpitava em seus olhos cansados. Tampouco sabia se estava acordado, pois o cheio amadeirado que fluía em seus sonhos durante a última semana invadiu-lhe o corpo despertando recôndidos desejos. Foi o despertar estridente do telefone que cortou o topor matutino e sublimou a sensação perfumada de aconchego.
A primeira inspiração vigorosa fez o sangue escorrer pelas veias e os músculos retesarem-se sob a pele quente. A volta à vida lembrou-o de que o companheiro de viagem chegaria a qualquer momento e da mochila que permanecia aberta à espera dos objetos lembrados na última hora para o festival.
Quarto, cozinha, banheiro, cozinha, quarto, quintal, cozinha novamente: hora do café, hora de sair. Partiram então num interlúdio de três horas. Perguntas vagas e palavras soltas iam de um para o outro, mas sempre estancavam na superficialidade de cada um. Mas ela chegou no ônibus que tomaram e puderam condensar aquelas conversas, liquefazendo risos e evaporando temores. Ao desembarcarem, foram para a casa alugada durante o inverno e esperaram os outros companheiros de república.
Para alguns era a primeira vez que se viam, para alguns era a primeira vez que existiam para o outro. Para todos era a oportunidade de se conhecerem. Conheceram-se elencando afinidade e descartando desafeições. Comiam ideias uns dos outros, bebiam e deliciavam-se com línguas nunca dantes roçadas, sequer experimentadas. Era um novo mundo de possibilidades que surgia a cada conversa, piada, estória, riso e imitação.
Ele provou o gosto do encontro com o desconhecido. Ele gostou de ver o Companheiro de viagem com ela, gostou de ver os companheiros de república escarafunchando-se mutuamente entre confissões e resoluções. E gostou ainda mais de ela ter-lhe possibilitado aconchego na noite realmente fria. Um Aconchego-de-Cabelos-encaracolando-se-de-Pulôver-Cinza-e-All-Star-sem-Cadarço, que lhe ofereceu seu casaco e seus braços de maioridade recém-conquistada.
Quando nos dias seguintes, o festival transcorria seguindo a programação, ele caminhava alternativamente, ora sozinho, ora em turma, com roupas novas ou puídas, admirando a paisagem e saboreando as pessoas. Às noites, a música invadia seu corpo e de seus amigos; dançavam, pulavam, beijavam-se, viviam... personagens eram criados, trejeitos e vocabulários copiados e as noites sempre seguiam, embriagando-lhes cada vez mais.
Ela às vezes não estava com o Companheiro de Viagem. Ela o queria, mas não da forma dele. Então, às vezes, o Companheiro de Viagem procurava nova companhia, até que encontrou um Companheiro Etílico.
Certa noite Ela cantava a plenos pulmões: “Because we are your friends, you never be alone again”; sua voz ecoava por sobre as batidas do eletro-house que compassava a pista, consolidando o companheirismo formado há poucos dias, mas de uma cumplicidade espantosa. Ele a escutava e formou coral com Ela, outras vozes juntaram-se e o eletro-house passou para o segundo plano, até extinguir-se e dar lugar a uma melodia da moda. Naquela mesma noite o garoto de cabelos encaracolando-se – aquele da outra noite fria - quis saber como seria estar beijando Ele e Ela. Ambos já provaram daqueles lábios, ao seu tempo cada um, mas não simultaneamente. A proposta causou relâmpagos de hesitação, trovejadas de curiosidade e uma garoa de sorrisos que culminou no ansiado beijo, um longo e demorado encontro.
Foi um beijo - um encontro entre Ela, Ele e uma terceira pessoa - numa noite fria de festival de inverno, mas não foi apenas isso, foi a materialização do sample entoado sobre as batidas do eletro-house: “porque nós somos amigos...