sábado, 20 de fevereiro de 2016

Devastação

à Mãe Helena

Foi devastador saber que não mais veria sua rede armada ao lado da cama, nem seu vestido dobrado sobre a cômoda a cada noite quando eu fosse dormir.

Foi devastador perceber que você não estaria sentada à porta todo fim da tarde, esperando pela nossa conversa de como seria o futuro de logo mais.

Devastador lembrar que o som da máquina de costura iria preencher aquela casa, agora que não é mais necessário elevar o tom da voz ou aumentar o volume da tv para que ele escutasse.

Devastador por eu não mais sussurrar algo enquanto você, lia seu salmo diário ou fazia suas orações pedindo saúde para a família, emprego para os netos, força para aguentar as muitas dores de seu corpo cansado.

É devastador por eu saber que não a encontraria com suas revistas de caça-palavras a distrair sua mente das preocupações cotidianas.

É devastador por não ser mais preciso acompanhá-la em sua solidão, após a partida dele.

A devastação, por as visitas de suas irmãs àquela casa não mais ser algo leve e descontraído.

E esta devastação foi tamanha que, por alguns dias, eu temi não suportar viver naquela casa grande e que há pouco era tão cheia de vida...

Mas após a devastação há sempre um recomeço – isso é tão certo quanto suas previsões de chuva; certo quanto sua teimosia em não ficar parada – e nesse recomeço, percebo que a vida ainda está naquela casa, em cada lembrança que ela nos traz, a mim e a todos que com você conviveram.

A casa permanecerá aberta, como aberta era sua mente para as coisas do mundo; permanecerá de pé, da maneira que você lidava com as dificuldades; e acolhedora, como você foi a todos aqueles que lhe procuravam à espera de um conselho ou palavra amiga.


Sua ausência naquela casa é aterradora, a saudade asfixiante, mas a esperança de um reencontro e a gratidão por ter feito parte de minha vida me dão força para prosseguir.