domingo, 2 de agosto de 2009

O que não se diz em meias verdades

Beatriz ainda sentia em sua face esquerda a quentura a mão materna mandando-a calar a boca. Foi um roçar acalorado entre a tez pálida e primaveril da garota e a força raivosa de fim de outono da mãe, gerada quando se deixa escapulir o controle da vida d’outrem. O fato deixou a garota ao mesmo tempo satisfeita e assustada, não por intencionalmente provocá-la ou desconhecer o peso da mão de sua mãe – ela conhecia muito bem – mas, por pensar que este tipo de atitude tinha sido deixado para trás, assim como sua infância fora reduzida a sutis lembranças.


O que fazer então? Não sabia lidar com meias verdades, nunca soube e por mais que tentasse se acostumar jamais conseguiria. O que são meias verdades? Um pouco de mentira? Um pouco de omissão? Um pouco de artifício? Um pouco de manipulação? – a verdade, ela sabe muito bem o que é! É quando se está de saco-cheio do cabelão e se vai ao banheiro, e se passa a tesoura, deixando-o todo repicado; e quando se pergunta o porquê disso tudo e se responde factualmente: "porque eu quis". - Para Beatriz, isso é verdade. Para sua mãe isso é desrespeito.


Beatriz estava cansada de se polir, estava cansada de se adequar, estava cansada de saber que seus problemas são infinitamente menores que as proporções analisadas pela mãe. Na verdade, não eram os problemas de Beatriz que assolavam o sono de sua mãe; era a liberdade que emanava do maneirismo da garota, era o olhar infantil que Beatriz lançava para o desconhecido, que a preocupavam.


Tudo isso empesteava a cabeça da garota com tamanha violência que ela nem se deu conta da pancada da porta de seu quarto que abafava o soluçar convulso da mãe aos prantos. Foi apenas ao mirar-se no espelho que ela pode perceber que meias verdades marcam mais que verdades inteiras, causam mais inquietações que o impacto de revelações tardias e que o peso descomunal de arrastá-las era uma simples escolha de cada um. Se a mãe quisesse permanecer atrelada à pseudoverdades, ela é livre para isso. Assim como Beatriz é livre para não fingir que nada aconteceu.

2 comentários:

Lizandra disse...

segundo fontes "científicas":
Do latim Beatrix, significa: aquela que faz alguém feliz, obviamente relacionado a felicidade do espírito. Na verdade este nome deriva de um verbo em latim Beare, que quer dizer: atender ao desejos de alguém, tornar alguém feliz, tornar alguém rico de espírito

Raimundo Neto disse...

Tem gente que te lê, sim, rapaz.

E também to com saudades...
Bora botar fogo na Mercê...rsrs!

Beijo!